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2 de fev. de 2009

Qual é a instância da Alma (Psyché) que nos incita à Guerra?


“Miseráveis humanos, por que motivo vocês pegam em armas e matam-se uns aos outros? Basta, deixem de combater. Fiquem em casa, em paz; e deixem os outros em paz” (As suplicantes – Ésquilo, cerca de 463 a.C.)


Devidos aos aterrorizantes conflitos deflagrados em nossa casa (oikós), gostaria de compartilhar com o leitor algumas ponderações sobre o antônimo da paz: a impiedosa e temida guerra.

Convém esclarecer que, apesar do soberano Zeus declarar que o deus da guerra, Ares, é o mais detestável de todos e da Hélade legar-nos preciosíssimos textos condenando a guerra, nem a Antiga Grécia, tampouco o Olimpo eram bem um reduto de paz e harmonia, muito ao contrário... Os deuses gregos, “criados” à imagem e semelhança de nós mesmos, insistiam em vingança e crueldade.

Ora animando, ora tirando a paz de todo Olimpo, “barracos” literalmente homéricos pipocavam entre todas as divindades. Àquela que Nietzsche (1844-1900) denominou como sendo “a infância dourada do Ocidente” sempre fora tingida, tanto de ouro quanto de rubro. Veremos adiante quando a nobilíssima altivez (timocrático + logístico) transmuta-se em soberba e, arrogante, irracional (timocrático + epitimético) como uma besta, deleita-se a chafurdar em sangue.

São famosas a irredutível ira de Aquiles pelo descendente do amaldiçoado Tântalo, o Rei atrida Agamêmnon, bem como a do próprio criador e soberano do Olimpo, Zeus, contra o titã Prometeu, por ter presenteado o fogo (conhecimento/techné) aos mortais (e desde então teme que nem mesmo o céu seja o limite para sua criatura).

Lembremo-nos de Medéia (431 a.C.), de Eurípides. A amaldiçoada não titubeia em assassinar seus próprios filhos para se vingar da rejeição e abandono do marido, Jasão. Encolerizada, pois ferida em seus brios ao ser preterida por outra, Medéia, embora reconheça o abismo que a espreita, não recua: “eu sofrerei; mas ele também sofrerá”.

Outro caso de fúria cega está na tragédia intitulada “Hipólito” (428 a.C.), também do tragediógrafo Eurípides. Afrodite, sentindo-se ultrajada pelo fato do jovem e casto Hipólito desprezar seus poderes de sedução e encanto, depositando oferendas e sempre enaltecendo as virtudes da austera deusa Ártemis. Desconsiderada, a deusa do Amor e da beleza, impiedosamente o enreda numa trama diabólica e fatal. A fim de destruí-lo, faz com que sua madrasta, outrora virtuosa, Fedra se apaixone perdidamente pelo enteado. Perturbada, por ter sido veementemente repelida pelo virtuosíssimo rapaz, a Rainha se enforca. Mas não sem antes pendurar uma tabuleta no pescoço acusando-o de tentar molestá-la. Eis que o Rei Teseu regressa. O desfecho desse capricho de Afrodite vitima ainda mais inocentes.

Os concursos de tragédias eram patrocinados pelos próprios aristois, os bem-nascidos, posto que mais educados, como forma de Paidéia (pedagogia) à população que era até remunerada para assistir. O enredo versava sobre a falta de limites, algo contra o qual, desde priscas eras, para o bem ou para o mal, o homem rebela-se. Em Hipólito, Eurípides nos ensina que, independente da divindade a quem se simpatize e escolha para devoção (e no mundo atual, como dantes, são inúmeros os deuses), não se deve desprezar as demais, menosprezar seus redutos, seja qual for seu estatuto na hierarquia dos vícios ou das virtudes.

Na Ilíada, de Homero (cerca de 850 a.C.), repleta de casos de “atér(cegueira moral que primeiro induz ao estado de desvario, depois, à ação desvairada e por fim, à ruína), é a deusa Ártemis quem, indignada por terem abatido uma corça prenhe, exige como penalidade nada mais, nada menos, que a vida da primogênita de Agamêmnon, Ifigênia, para que, com vento, as naus possam partir para invasão e pilhagem de Tróia (Ílion).

Em um dos primeiros artigos publicados na Carta Forense, intitulado “Ares e Athena – arautos da Guerra” (em Roma eles passaram a ser chamados de Marte e Minerva), discorri sobre esses deuses guerreiros e seus respectivos modus operandi. Vimos que a deusa da Sabedoria e Justiça sempre obtém vitória em qualquer conflito que interceda porque, dentre outras razões, só apela para a violência (algo que abomina) em último caso, quando não resta mais nenhuma possibilidade de diálogo, quando todas, absolutamente todas as tentativas diplomáticas de acordo foram esgotadas. E é justamente por isso, por evitar a guerra a todo custo, que Athena é sempre acompanhada por Niké (a Vitória). Reconhecidamente, o fato da deusa da Sabedoria, guardiã da paz, lograr êxito em aplacar a fúria das Erínias (vide também nesse Blog, o artigo sobre o crime de matricídio cometido por Orestes), a credencia ao resplandecente epíteto de “deusa da Justiça”.

Mas, seja entre deuses mitológicos, personagens das tragédias, mortais ou imortais, qual é a instância da alma (Psyché) que nos incita à Guerra?

Recentemente, abordando a alma em Platão, vimos que esta é composta de três dýnamis (potências): Epitimética, Timocrática e Logística.

Na instância da potência Epitimética, por exemplo, só nos dispomos a lutar quando, semelhante aos animais, precisamos saciar a fome, questão de sobrevivência; se formos obrigados a defender a própria vida ou nosso território. E vale dizer, para o abrigo necessário. Diferente do homem, o animal não ambiciona ampliar seus domínios para além dos que os utiliza.

O Logistikón, não se imiscui em beligerância porque seria um contra-senso. Hierarquizador, o lógos situa o pensar elevando-o acima das demais potências. A função dessa parte de nossa alma é de cogito, ratio e quem pensa não resvala, não sucumbe à bestialidade.

A potência de nossa alma responsável pelo fomento de polêmicas e guerras é a Timocrática, quando em hýbris (desmedida).

Se alguém nos inflige alguma desonra e sentimo-nos ultrajados é essa potência que é atingida, podendo imediata e cegamente manifestar-se.

É quando humilhados pelo fracasso em obter reconhecimento de nossa identidade e dos que nos são caros, dos valores pulsantes em nosso peito que, seja um indivíduo, um clã, um povo ou uma grande nação, consome-se em ressentimento, clama vingança e a qualquer momento, instaura a guerra.

Timocrática (corajosa, destemida, indômita) é a parte de nossa Psyché responsável por nosso amor-próprio. Quando narcísica, torna-se sedenta de que sejam tributadas as devidas glórias, anseia por aprovação, admiração e aplausos dos outros (alter).

Em muitas ocasiões é salutar que a estimemos, pois, do contrário, seríamos acometidos pela indesejada atimia (a = sem, timós = peito, coração), que implica falta de honra, nobreza, de timós. Eis a marca dos tíbios (frouxos, covardes), indignos, tão desprezíveis quanto constrangedores.

Magoados, pois ofendidos em nosso Timós, nossa honra, somente uma única coisa é capaz de nos comover demovendo-nos da idéia fixa de partir para a ação violenta (própria dos ressentidos): prezar um denominador comum com o suposto inimigo.

É assim que ocorre nos ordinários e/ou extraordinários conflitos familiares, entre irmãos, marido e mulher, cunhados e demais membros. Atingidos em seus “phrenas”, como diria Homero, o homem pode até ser acometido pela atér, mas diante de filhos, pais, avós ou irmãos, por consideração a eles, a orgulhosa besta, que faz morada em seu timós, pode recuar em seus chifres e dentes afiados.

Em nosso destempero timocrático (que resvala em presunção, arrogância), sem que sejamos sensibilizados, não cessamos fogo. É por isso que o mal, em muitos estudos, é identificado como sendo a incapacidade de amar.

Todos nós sabemos que os povos envolvidos nos conflitos políticos e religiosos, que persistem no globalizado século XXI, são permeados por um delicado e antiqüíssimo ressentimento mútuo. Sem algo em comum a que se ame, se considere, não há pedido de desculpas, ressarcimento moral ou pecuniário que aplaque a fúria.

Quando não se ama nem se pensa, a guerra, o mal em sua apresentação mais violenta, aprisiona nossa alma. Para que haja possibilidade de instaurarmos e mantermos a paz, há de se resgatar a philía ao antropos (amor, amizade ao homem), denominador comum que nos impele a considerar outras almas. Há que se permitir o império do Logistikon (a potência da alma, psyché, que pensa, delibera). Como a pensadora judia alemã, Hannah Arendt, ponderando sobre o mal, enfatizara: o Mal é não Pensar!

Por fim, na Guerra só se contam infelizes e malditos. Infelizes os derrotados; malditos os vencedores. E eis a pujante e ininterrupta machina fatalis a todo vapor: derrotados ontem, ressentidos hoje, fiéis seguidores do maldito Ares amanhã. Até que se Ame; até que se Pense.

Dedico esse artigo a avó de Miriam Barmak Sapoznik e ao menininho palestino do livro “Destinos Deslocados”, de Alia Carol – publicado em 2007 pela editora Insular.

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Eis que a Sabedoria reina, mas não governa, por isso, quem pensa (no todo) precisa voltar para a caverna, alertar aos amigos. Nós vamos achar que estais louco, mas sabes que cegos estamos nós, prisioneiros acorrentados à escuridão da caverna.

Abordo "O mito da caverna", de Platão - Livro VII da República.

Eis o télos (do grego: propósito, objetivo) da Filosofia e do filósofo. Agir na cidade. Ação política. Phrônesis na Pólis.

Curso de Mitologia Grega

Curso de Mitologia Grega
As exposições mitológicas explicitam arquétipos (do grego, arché + typein = princípio que serve de modelo) atemporais e universais.

Desse modo, ao antropomorficizarem os deuses, ou seja, dar-lhes características genuinamente humanas, os antigos revelaram os princípios (arché) de sentimentos e conflitos que são inerentes a todo e qualquer mortal.

A necessidade da ordem (kósmos), da harmonia, da temperança (sophrosyne) em contraponto ao caos, à desmedida (hýbris) ou, numa linguagem nietzschiana, o apolíneo versus o dionisíaco, constitui a base de toda antiga pedagogia (Paidéia) tão cara à aristocracia grega (arístois, os melhores, os bem-nascidos posto que "educados").

Com os exponenciais poetas (aedos) Homero (Ilíada e Odisséia), Hesíodo (A Teogonia e O trabalho e os dias), além dos pioneiros tragediógrafos Sófocles e Ésquilo, dispomos de relatos que versam sobre a justiça, o amor, o trabalho, a vaidade, o ódio e a vingança, por exemplo.

O simples fato de conhecermos e atentarmos para as potências (dýnamis) envolvidas na fomentação desses sentimentos, torna-nos mais aptos a deliberar e poder tomar a decisão mais sensata (virtude da prudencia aristotélica) a fim de conduzir nossas vidas, tanto em nossos relacionamentos pessoais como indivíduos, quanto profissionais e sociais, coletivos.

AGIMOS COM MUITO MAIS PRUDÊNCIA E SABEDORIA.

E era justamente isso que os sábios buscavam ensinar, a harmonia para que os seres humanos pudessem se orientar em suas escolhas no mundo, visando atingir a ordem presente nos ideais platônicos de Beleza, Bondade e Justiça.

Estou certa de que a disseminação de conhecimentos tão construtivos contribuirá para a felicidade (eudaimonia) dos amigos, leitores e ouvintes.

Não há dúvida quanto a responsabilidade do Estado, das empresas, de seus dirigentes, bem como da mídia e de cada um de nós, no papel educativo de nosso semelhante.

Ao investir em educação, aprimoramos nossa cultura, contribuimos significativamente para que nossa sociedade se torne mais justa, bondosa e bela. Numa palavra: MAIS HUMANA.

Bem-vindos ao Olimpo amigos!

Escolha: Senhor ou Escravo das Vontades.

A Justiça na Grécia Antiga

A Justiça na Grécia Antiga

Transição do matriarcado para o patriarcado

A Justiça nos primórdios do pensamento ocidental - Grécia Antiga (Arcaica, Clássica e Helenística).

Nessa imagem de Bouguereau, Orestes (Membro da amaldiçoada Família dos Atridas: Tântalo, Pélops, Agamêmnon, Menelau, Clitemnestra, Ifigênia, Helena etc) é perseguido pelas Erínias: Vingança que nasce do sangue dos órgãos genitais de Ouranós (Céu) ceifado por Chronos (o Tempo) a pedido de Gaia (a Terra).

O crime de matricídio será julgado no Areópago de Ares, presidido pela deusa da Sabedoria e Justiça, Palas Athena. Saiba mais sobre o famoso "voto de Minerva": Transição do Matriarcado para o Patriarcado. Acesse clicando AQUI.

Versa sobre as origens de Thêmis (A Justiça Divina), Diké (A Justiça dos Homens), Zeus (Ordenador do Cosmos), Métis (Deusa da presciência), Palas Athena (Deusa da Sabedoria e Justiça), Niké (Vitória), Erínias (Vingança), Éris (Discórdia) e outras divindades ligadas a JUSTIÇA.

A ARETÉ (excelência) do Homem

se completa como Zoologikon e Zoopolitikon: desenvolver pensamento e capacidade de viver em conjunto. (Aristóteles)

Busque sempre a excelência!

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TER, vale + que o SER, humano?

As coisas não possuem valor em si; somos nós que, através do nôus, valoramos.

Nôus: poder de intelecção que está na Alma, segundo Platão, após a diânóia, é a instância que se instaura da deliberação e, conforme valores, escolhe. É o reduto da liberdade humana onde um outro "logistikón" se manifesta. O Amor, Eros, esse "daimon mediatore", entre o Divino (Imortal) e o Humano (Mortal) pode e faz a diferença.

Ser "sem nôus", ser "sem amor" (bom daimon) é ser "sem noção".

A Sábia Mestre: Rachel Gazolla

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O Sábio Mestre: Antonio Medina Rodrigues (1940-2013)

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