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1 de abr. de 2016

Carcinoma: caranguejo câncer é!



A filosofia é apenas um retorno consciente dos dados da intuição”. Henri Bergson

Há momentos na vida – diante de um diagnóstico de câncer -, por exemplo, em que, frágeis e impotentes, nos flagramos perscrutando convicções dantes “inquestionáveis”. 

No lamaçal da areia movediça da angústia, erguemos os olhos aos céus e, tal qual Demócrito (520-440 a.C.), aventamos: "Deus, ou quer impedir os males e não pode, ou pode e não quer, ou não quer nem pode, ou quer e pode”. 

E o filósofo prossegue examinando as hipóteses: “Se [Deus] quer e não pode, é impotente: o que é impossível em Deus. Se pode e não quer, é invejoso, o que, igualmente, é contrário a Deus. Se nem quer nem pode, é invejoso e impotente: portanto nem sequer é Deus. Se pode e quer, o que é a única coisa compatível com Deus, donde provém então a existência dos males? Por que Deus não os impede?". 

Ao inquirirmos sobre a origem de um Mal como o câncer, o lógos (raciocínio) se embrenha na busca por relações de causalidade. 

Intriga-nos o fato de que nem mesmo os pequenos inocentes sejam poupados dessas enfermidades, muitas vezes hereditárias, pois provenientes de uma “hamartía”, que na tragédia grega é a marca do erro, da falta cometida por algum antepassado.

Nesse sentido, os mitos, as tragédias e os pioneiros da medicina são elucidativos, pois traduzindo e comunicando o incognoscível, nos alertam para os grandes perigos da existência, explicitando o desencadeamento de ações que, por hýbris (desmedida), culminam em perda, dor e lamento.



Para Sócrates, corpo e alma são indissociáveis: “Assim como não é possível tentar a cura dos olhos sem a da cabeça, nem a [cura da] cabeça sem a do corpo, do mesmo modo não é possível tratar do corpo sem cuidar da alma, sendo essa [a alma] a causa de desafiarem muitas doenças e o tratamento dos médicos helenos [gregos], por desconhecerem estes o conjunto [corpo e alma] que importa ser tratado, pois não se pode ir bem a parte quando vai mal o todo.”



Corroborando essa suspeita socrática, antigamente os enfermos pernoitavam no templo de Apolo, deus da saúde, da música e da harmonia para que, concentrados em seus sofrimentos e sob a influência do sagrado (Fannum), atinassem aos indícios de desordens e desarmonias psíquicas que se materializavam no corpo.


O termo grego “karkínos” (carcinos, daí carcinoma), já fora utilizado pelo Pai da Medicina, Hipócrates, e significa caranguejo, o crustáceo ao qual é dedicado a constelação que identifica o signo astrológico de câncer.

“Karkínos” refere-se também à emblemática enfermidade de câncer que, embora não seja a principal causa de óbitos no mundo (as moléstias cardiopatas detém pole position), tem sido considerado “O” grande mal, desde o século passado.

Friamente falando, o câncer – enfermidade multifatorial (ou seja, não é de causa única) – é, por definição: “o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que tem em comum o crescimento desordenado, portanto, maligno, de células que invadem os tecidos e/ou órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo.”.

A associação da moléstia de câncer ao caranguejo que – ligeiro, move-se para todos os lados e cujas patas dianteiras são como pinças que agarram com firmeza – também foi apontada pelo médico, farmacêutico e filósofo romano Claudio Galeno (cerca de 130 d.C.) e deve-se aos aspectos do tumor, que assemelham-se à figura do crustáceo, bem como ao fato da doença ser silenciosa e sorrateiramente agressiva, prendendo-se à vítima e, na maioria dos casos, destruindo-a até o fim.

Como em outras terríveis mazelas vivenciadas por nossos antepassados (a lepra nos tempos bíblicos, a peste no medievo e a tuberculose no séc. XIX, por exemplo), sobre o câncer paira o estigma de sentença de morte.

Uma vez que, na antiguidade, acreditava-se que o câncer era desencadeado pela “bile negra”, pela “melancolia” e demais estados de alma, outro estigma que a doença carrega é o da incapacidade de lidar adequadamente com as vicissitudes emocionais.

As suspeitas quanto ao cunho “metafísico” (além/acima da física) da moléstia persistem até os dias atuais: “peste moderna, o câncer não significa nada mais que um duro golpe do destino (…). Pode significar punição, culpa ou pecado (...)”, afirmam os estudiosos Hürny e Adler (1991).

Embora a ideia de que distúrbios corpóreos (soma) tenham origem psíquica esteja presente em todas as culturas e seja tão antiga quanto a medicina, o termo “psicossomático” foi cunhado no século passado por Heindroth.

Construtores das bases teóricas e técnicas da psicossomática moderna, Franz Alexander e Michael Balint afirmam que: “Teoricamente, cada doença é psicossomática, uma vez que fatores emocionais influenciam todos os processos do corpo através das vias nervosas e humorais (…) a presença de conflitos inconscientes pode levar à manifestação de queixas físicas (...)”.

Também pioneiro da psicossomática, Georg Groddeck (1923) é contundente: “A doença não provém do exterior, o próprio ser humano a produz”, o que corrobora a tese de que todos os organismos sejam capazes de desenvolver câncer.

A proposta cartesiana de fragmentar (dividir em partes) para conhecer melhor, tratando a doença e não o doente – um ser complexo e sujeito a fatores não apenas orgânicos, mas também emocionais e culturais – eclipsou o imperativo de enxergar o paciente como um todo, o que está sendo retomado através da psico-oncologia (confira os vídeos abaixo).

Sendo a doença, representação simbólica de nossas predisposições psíquicas, a cura deve atentar à sua globalidade de forma multidisciplinar (aspectos filosóficos, psicológicos e sociais), para que se possa compreender “os destinos da excitação pulsional no organismo e sua possibilidade de descarga”.

Na anamnese, quando trazemos a memória à tona, diante de um paciente acometido por “alexia”, que é a falta de palavras para exprimir emoções, os antigos asclepíades indicavam a interpretação dos sonhos como caminho para compreensão das neuroses (confira outras prescrições terapêuticas no artigo “Apolo, Quíron, Asclépio e Hipócrates – o mito grego da medicina.” AQUI).


É inegável que o reconhecimento e a reação às emoções “(...) depende essencialmente da valorização subjetiva dada pelo indivíduo e de como a pessoa constrói mentalmente o fato”. Isso é o que, além de nos tornar mais (ou menos) susceptíveis aos golpes da vida, confere caráter inexato à medicina.


Somos parte de um meio extremamente complexo de sistemas (genético, anatômico, neurológico, endócrino, imunológico, psicológico, social, etc.) e em níveis diversos, do subcelular ao ambiental, daí a relevância do calibre e do tom da linha com a qual alinhavamos as experiências afetivas que podem culminar em sentimento de culpa, raiva, desgosto, mágoas e ressentimentos.

Os primitivos, detendo um sistema de pensamento místico ou pré-lógico, talvez tenham intuído que o câncer/doença tenha algo a ver com o câncer/signo astrológico, pois ambos dizem respeito aos mesmíssimos temas: origens, antepassados, herança e relações familiares.

Não surpreende que a palavra hamartía apresente-se tanto na tragédia quanto na medicina, nessa última, indicando “problema de desenvolvimento, causado pela combinação e localização anormais de tecidos normalmente existentes em uma determinada área”.

“Karkínos” aponta para uma correlação simbólica entre o caranguejo moléstia e o caranguejo constelação (signo zodiacal) – ambos câncer –, que tanto sensibilizam, pois dizem respeito à nossa maior fonte de  abandono e desgosto e/ou de felicidade e amparo: a família, que - PARADOXALMENTE! - um câncer tanto une.





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